Por: Gustavo Barros
Cabe ao superendividado apresentar proposta de repactuação das dívidas durante a audiência de conciliação. Dessa forma, o credor que comparece à audiência e apenas recusa o acordo não pode ser penalizado com base no Código de Defesa do Consumidor.
Esse foi o entendimento da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento de um recurso especial, que foi decidido por 3 votos a 2.
O caso em questão trata-se de um consumidor superendividado perante diversas instituições financeiras e que pediu, a uma delas, uma audiência de repactuação, conforme previsto no artigo 104-A do Código de Defesa do Consumidor.
O parágrafo 2º da referida norma obriga o credor a comparecer ao ato, ao menos por meio de procurador com poderes especiais e plenos para transigir. Caso contrário, a exigibilidade dos créditos e os encargos da mora podem ser suspensos.
O banco enviou um preposto à audiência, que se limitou a rejeitar a proposta apresentada pelo consumidor, sem apresentar qualquer contraproposta. Então, o juiz de primeira instância aplicou as sanções previstas, decisão que foi posteriormente confirmada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.
O TJRS entendeu que houve uma tentativa de frustrar a conciliação prévia. Para a corte estadual, a conduta adotada pelo banco contrariou o princípio da cooperação para a recuperação financeira do superendividado, cujo propósito é assegurar o seu mínimo existencial.
A 3ª Turma do STJ derrubou a sanção por 3 votos a 2. Prevalecendo o voto do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, acompanhado pelos ministros Humberto Martins e Moura Ribeiro. Os ministros defenderam que a lei estabelece o ônus de propor a repactuação para o devedor, não ao credor. Dessa forma, a interpretação do artigo em questão deve ser restritiva.
A consequência legal cabível ao credor que comparece à audiência de repactuação e, sem apresentar contraproposta, apenas rejeita o acordo proposto pelo devedor é a submissão a um processo judicial que poderá resultar na revisão do contrato envolvido.
“Como é ônus do devedor a apresentação de proposta conciliatória, ela não pode ser exigida dos credores e, como a consequência da falta de acordo é a eventual submissão do contrato à revisão e repactuação compulsórias, não há respaldo legal para a aplicação analógica das penalidades do artigo 104-A, parágrafo 2º, do CDC.”
A relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, e a ministra Daniela Teixeira foram vencidas. No entendimento delas, a sanção é aplicável, uma vez que, ao estabelecer a audiência de repactuação, a lei pretendia exatamente possibilitar uma renegociação.
Dessa forma, é justificável a aplicação da sanção a instituição financeira que rejeitou genericamente a proposta de plano de pagamento apresentada pelo devedor. “Essa postura cômoda não se coaduna com a boa-fé que deve nortear as relações entre consumidores e fornecedores em geral e, mais ainda, entre consumidores e fornecedores de crédito, ante a situação de vulnerabilidade acentuada”, destacou a ministra Nancy.
Na visão da relatora, o mero comparecimento do credor à audiência de conciliação, sem apresentar contraproposta diante da recusa à proposta do consumidor superendividado, revela uma postura contrária ao dever de cooperação.
Tal conduta, na prática, equivale à ausência do credor, o que autoriza a aplicação das sanções previstas no Código de Defesa do Consumidor.
“O propósito da audiência conciliatória é justamente o de possibilitar a solução na fase pré-processual, o que se mostra inviável se uma das partes não estiver disposta ao diálogo. A ausência de colaboração, pela instituição financeira, é incompatível com a boa-fé e, nessa medida, justifica a imposição das sanções previstas para o seu não comparecimento.”
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Fonte: REsp 2.188.683