Rappi, Ifood, Uber Eats e empresas similares têm ganhado na Justiça do Trabalho a maior parte das discussões com os entregadores de aplicativos, que pedem o reconhecimento de vínculo de emprego. Hoje há 935 processos sobre o tema nos Tribunais Regionais do Trabalho (TRTs).
Os dados foram levantados pela Data Lawyer, empresa especializada em estatística e jurimetria. Estão incluídos no estudo, além dos entregadores de aplicativos, os motoristas de Uber, pois a empresa utiliza o mesmo nome para as duas atividades.
Das 432 ações já julgadas, apenas cinco foram favoráveis aos entregadores e em 172 delas as empresas ganharam. O levantamento mostra ainda que 81 pedidos foram parcialmente aceitos, em 97 foram feitos acordos e houve desistência em 40 desses casos. Os demais foram encerrados por questões processuais – arquivados por ausência do trabalhador, prescritos, entre outros motivos.
Dos 24 TRTs no país, só três não registraram ações sobre o assunto. O maior número de ações está concentrado no TRT da 3ª Região (MG), com 310 casos. Dentre as julgadas, os entregadores perderam em 104, foram parcialmente aceitas 24 ações e em 62 dos casos foram fechados acordos.
São Paulo é o segundo Estado em ações. Os tribunais de Campinas (TRT-15) e o da capital (TRT-2) adotam entendimentos diferentes. Em Campinas, há 167 ações, dentre as julgadas, os entregadores perderam em dois casos, 12 pedidos foram concedidos parcialmente e um terminou em acordo. Já no TRT de São Paulo, são 159 ações sobre o tema. Em 30, os entregadores perderam, oito tiveram os pedidos concedidos parcialmente, 18 ações terminaram em acordo e em apenas uma houve vitória do trabalhador.
A tese jurídica dos entregadores é semelhante a dos motoristas de apps. Pedem o reconhecimento de vínculo com a empresa, o que lhes renderia o pagamento de direitos trabalhistas, como férias remunerada, horas extras e 13º salário.
Para que o vínculo seja caracterizado, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) prevê ser necessário que a prestação do serviço seja realizada por pessoa física, com pessoalidade, ou seja, não pode se fazer substituir, além de onerosidade (recebimento de uma contraprestação), subordinação jurídica e não eventualidade.
No caso dos aplicativos, não há subordinação nem habitualidade já que o entregador escolhe quando e se quer trabalhar. Os trabalhadores, porém, alegam que são punidos pelo app se escolhem entregas ou ficam sem trabalhar, o que atrairia os critérios da não eventualidade e da subordinação jurídica.
Para o Ministério Público do Trabalho (MPT), a “subordinação algorítima” – punição por recusa de corridas – dos entregadores é maior do que dos motoristas. O órgão vê diferença na atuação solitária dos entregadores na Justiça frente às empresas, que mapeiam as ações e acompanham as teses. O MPT, porém, considera mais fácil ser dado provimento a um caso individual que coletivo, pelo tamanho do impacto que uma decisão para toda a categoria terá.
O órgão propôs duas ações coletivas sobre o tema. Os processos estão suspensos por decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. O magistrado paralisou as ações coletivas em geral no país até decidir sobre o alcance delas – nacional ou regional.
Segundo o professor de direito do trabalho Ricardo Calcini, quando a tese surgiu, havia mais acordos, já que as empresas ainda temiam o resultado que os julgamentos poderiam ter e queriam evitar a construção de jurisprudência contrária. Porém, conforme elas conseguiram decisões favoráveis foram deixando os casos serem julgados.
O Tribunal Superior do Trabalho (TST) ainda não decidiu o tema para os entregadores, mas já se mostrou favorável às empresas de apps de transporte, em um processo envolvendo motorista (Processo: RR-1000123.89.2017.5.02.0038).
A decisão única do TST sobre motoristas de aplicativos não significa, contudo, que o assunto está pacificado, nem para eles nem para os entregadores, sendo necessário aguardar uma melhor consolidação da jurisprudência.
Fonte: Valor Econômico